Todas as manhãs , com uma pequena diferença de tempo, de dois a três minutos, eles anunciam a hora. O primeiro deles, uma pequena maravilha da natureza e uma das menores aves do mundo, o rouxinol, sempre no mesmo horário, de forma precisa e britanicamente às cinco horas, solta o seu trinado maravilhoso de algumas dezenas de decibéis que me transporta ao tempo de criança. Sinto pena das pessoas que nascem e se criam em grandes centros, principalmente as crianças que nunca tiveram ou não têm a oportunidade e o prazer de ouvir o canto matinal de pássaros como o rouxinol. Como uma ave tão pequena consegue ter um canto tão belo? É indescritível! Um canto ritmado, forte, límpido, ligeiramente agressivo e ao mesmo tempo suave. Ele inicia com um trinado forte, em seguida faz um rápido e lindo solo e encerra como começou, um trino, como fechando um círculo. É isso! Um canto em círculos.
Quando criança, no sítio onde morávamos, eu era sempre acordado por rouxinóis que cantavam
em árvores que havia nos fundos da nossa casa, onde eles construíam seus ninhos. Aos pouco, à seu canto, juntava-se um coro de outras aves como o bem-ti-vi e o sabiá branco. Que bela sinfonia. Sem pardais. Esses são bagunceiros. Cantam também maravilhosamente, mas de forma não cadenciada ou sequenciada. Um pouco mais tarde, já com o sol bem alto iam surgindo os músicos retardatários: o corrupião, o galo da campina, o pintassilgo, o golinha e outros mais. Que beleza e quanta saudade.
O outro, o segundo, normalmente atrasado, anuncia a hora com o seu ensurdecedor barulho de centenas, ou talvez milhares, de decibéis. Trata-se de uma maravilha da capacidade inventiva do homem e imprescindível às necessidades da vida moderna, uma gigantesca aeronave tipo jumbo. Quando o anúncio se faz simultaneamente, apenas estes, os grandões, são ouvidos.
Antes eram somente os rouxinóis. Os invasores surgiram após a construção do novo aeroporto internacional Pinto Martins e, consequentemente, com as mudanças das rotas aéreas de chegada e saída dos voos. De início houve necessidade de uma adaptação auditiva à nova situação a fim de possibilitar ao indivíduo realizar atos comuns ao dia-a-dia como assistir televisão, conversar, telefonar e dormir. Depois nos adaptamos. Como diz o ditado, "nos acostumamos, também, com o que não presta".
Depois de feito o anúncio das horas, de duas formas tão diferentes e sonoramente opostas, levanto-me. É hora de regar as plantas, um dos meus prazeres de aposentado. Ligo a torneira, pego a mangueira e inicio o meu lazer matinal. Minha esposa vive insistindo para eu comprar um aspersório, a fim de evitar movimentos capazes de afetar minha coluna que já não anda muito bem, faz tempo. Até pensei no caso. Desisti. Aguar as plantas é uma atividade saudável, argumentei, e portanto é muito importante para o meu bem estar.
Pensando bem, acho que, na realidade, a aspersório não tem muito a ver com as dores na minha coluna, mas, com certeza, evitaria o barulho(?) provocado pelo jorrar da água da mangueira, acordando-a, quando rego algumas plantas que ficam embaixo de sua janela.
" Durma-se com um barulho desses"! E um jumbo não consegue acordá-la!
Mossoró, 29 de Dezembro de 2008.
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