Conversava com um amigo quando veio à baila o tema fotografia. Disse que gostava muito de fotografar e perguntou ao amigo se gostaria de ver algumas fotos. Ele respondeu que sim. Apanhou um número considerável de fotografias e entregou-lhe. Enquanto conversavam o amigo olhava as fotos e fazia comentários. Quando terminou de vê-las, disse:
_ Quase não há fotos de pessoas. Por quê? Você não gosta de fotografar gente?
_ Não é bem uma questão de gostar ou não gostar, respondeu. O problema é que fotos de pessoas não são verdadeiras. Eu gosto de fotos que expressam verdades. Com pessoas isso é quase impossível. Por isso não saio por aí a fotografá-las.
_ Você pode ser mais explícito, perguntou-lhe o amigo.
_ Claro, respondeu. As únicas fotos autênticas de pessoas são aquelas feitas quando elas não percebem. Essas são verdadeiras. Não há preparação, nem arranjo, nem pose. Você clica e pronto.Entendeu?
_ Entendi perfeitamente, respondeu. Entretanto, não concordo plenamente com você. Há pessoas que se deixam fotografar naturalmente.
_ Só se estiverem mortas! De outra maneira não há como. As pessoas preparam-se até para tirar fotos 3 x 4. Não, não gosto de fotografar gente.
_ O que você me diz de recém-nascidos, pessoas especiais e doentes?
_ Concordo com você. Nesses casos é possível fazer fotos bem reais se não houver alguém da família por perto. Caso contrário, há sempre um arranjo daqui, outro dali.
_ Você não está sendo radical?
_ Talvez esteja. Mas a verdade é que gosto de fotografar a natureza: plantas, animais - irracionais, óbvio - e lugares. Esses permitem-me fotografá-los como realmente são. Com pessoas isso não acontece. Fotografar crianças pequenas é muito difícil. Os pais tentam, ajeitam, adulam, agradam com doces e brinquedos, até ameaçam, as vezes, mas não há solução. Ao final se as fotos não saem de boa qualidade a culpa é do fotógrafo; quando crescem um pouco, elas próprias fazem poses e ficam com cara de bobas; os adolescentes posam sempre como se fossem manequins, coitados; as mulheres têm sempre que retocar a maquiagem, ajeitar os cabelos e complementam com um sorriso que vai de uma orelha a outra; os homens de meia idade são ridículos: encolhem a barriga, estufam o peito e disfarçam com um sorriso amarelo " a la Clarke Gable"; fotografar noivos é um martírio. Que coisa cansativa! Poses e mais poses ensaiadas. Nada real, nada autêntico.
_ Continuo achando que você está sendo extremista, disse o amigo.
Ele continuou com seus argumentos.
_ Com a natureza nada disso acontece. Se você fotografa uma montanha, um rio, uma flor ou uma fera não há ensaios, a não ser do fotógrafo. No final as fotos mostram realmente o que são: uma montanha, um rio, uma flor e uma fera. Não há disfarces. Por isso gosto de fotografá-los. Pela autenticidade, originalidade, naturalidade. Isso não acontece com humanos, concluiu.
_ Sei não, disse o amigo. Penso diferente. Vejamos por esse outro ângulo. A montanha modifica-se à cada estação do ano, tem portanto, o visual alterado; o rio muda, naturalmente, a cada segundo. Nunca é o mesmo; a flor, tão bela no momento da fotografia, tem vida efémera - a maioria - e logo estará murcha, diferente; e, a fera, tão agressiva, torna-se dócil após saciada a fome. Portanto, considerando o que você falou sobre pessoas e analisando as coisas sob o meu ponte de vista, podemos concluir que não há - não importa o reino - fotos verdadeiras. Há sim o momento verdadeiro de cada foto. O que você me diz?
_ Vendo as coisas sob esse aspecto, acho que você tem razão. Não havia pensado dessa maneira. Parabéns pelo raciocínio. Todavia vou continuar sem gostar de fotografar pessoas.
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